As facetas perfeitamente simétricas das pedras que ornavam o círculo em seu dedo anular direito reluziam em prisma na parede. O sol morno aquecia na medida certa, tocando suave os ombros desnudos e delineados que ela exibia sob as alças delicadas do vestido.

 

“Nem pense em se mexer agora!”

 

A voz enfática da artista cortou o silêncio e impediu uma risada a beira da explosão.

 

“Ah, gente, deveria ter mandado uma foto ao invés de posar para você.”

 

“Não conseguiria o mesmo efeito que tenho agora. Você nem imagina como este ângulo e esta luz estão perfeitos. Fique quieta!”

 

Riu junto com a musa. Os olhos se encontraram por mais tempo do que esperavam. A modelo ficou quieta, embora quisesse comer, conversar... Jamais diria, mas pensava em dizer. Um quadro pintado por ela! Um sonho! Poderia ter de outros artistas famosos, mas era o traço dela que desejava, o risco, a cor.

 

Quando o traço e o que a artista precisava estabelecer havia terminado, foi libertada.

 

“Ai, fiquei com câimbras!”

 

“Exagerada. Nem deu tempo para tanto.”

 

Chegaram tão perto uma da outra. A artista desconversou.

 

“Te aviso quando estiver pronto.”

 

Abriu a porta do ateliê. A musa saiu a contragosto.

 

“Vou esperar ansiosamente.”

 

Chegou em casa e encarou a parede na qual a arte faria morada. O muro que separava dois mundos. No outro lado da cidade, o vermelho pintava os lábios na tela e os olhos se tingiam de noite.