

Os jardins da infância*

* As informações sobre a canção e a imagem estão logo abaixo do texto.
Camarás. Uma cerca de camarás em frente à casa na qual morava. Os buquês multicoloridos sequestrados do pé para decorar a casa e o cabelo das bonecas. O tamanho proporcional para o tamanho das mãos de menina e dos móveis da casinha. Não tinha muitos, mas reservava alguns copinhos do xarope cor-de-rosa para decorar a mini mesa de jantar.
Mesinha e quatro cadeirinhas de pés cor-de-rosa. Preferiria que fossem azuis, mas a cor de menina nos brinquedos de casa era uma mania. Pelo menos o tampo e os assentos eram brancos. E as fofoletes gostavam muito e se sentavam confortavelmente na casinha de papelão. Construção própria, diga-se de passagem. As janelas tinham até cortinas.
A mesinha e a casa só perdiam em preferência do parque de diversões, uma surpresa que as fofoletes não imaginavam. O padrinho da menina, novinho, ainda universitário, filho da patroa da mãe, havia recebido o primeiro pagamento. A menina não sabia direito o que era isso, mas achou que deveria ser importante quando foi convidada por ele para sair e comprar um presente.
O passeio de fusca amarelo, a imensa loja de brinquedos, o rosto iluminado feito um sol tocando uma planície inteira de luzes e cores. O encantamento crescente e o êxtase de se ver merecedora de um parque de diversões das fofoletes. Palavras não seriam suficientes para descrever o tamanho da alegria sentida naquele dia. Talvez se soubesse compor...
A chegada em casa, a caixa tão grande e o esforço de carregá-la, abri-la. O desembrulhar. A montagem do escorregador, do balanço, da gangorra, do gira-gira. O letreiro do portão, o cheiro de madeira e tinta. E as fofoletes? Felicidade infindável...
E a menina colheu mais flores. E colocou-as nos cantos do quadrado verde de molduras brancas (meio fio, claro). Um quadro perfeito, um cantinho da memória, uma saudade imensa de inventar os próprios jardins...
* "Mirrors" é da cantora inglesa Sally Oldfield. Lançada em seu álbum de estreia, "Water Bearer", de 1978, a canção me lembra infância, talvez pela delicadeza dos sons agudos no início, no melhor estilo xilofone. Penso que ela transmite uma alegria inocente. A imagem foi montada com a fofolete e a flor de cambará, sem muitos floreios, porque a ideia era mesmo remeter aos dois elementos de forma infantil. Pensei em dar um ar de "recordação" à imagem, mas manter as cores me pareceu mais importante. As imagens utilizadas podem ser encontradas aqui: http://www.cesarpapini.com.br/peca.asp?ID=3385383&ctd=22&tot=&tipo=&artista= e https://www.sitiodamata.com.br/lantana