

Solidão *

* As informações sobre a canção e a imagem estão logo abaixo do texto.
A imensa vontade de correr desesperadamente, de se entregar ao vento com cada fibra do corpo, até o fôlego faltar, até o ar ser um fio entre o agora e o mais além. Fugir, fugir de tudo, de todos, daquela dor latejante. Ela jamais estaria preparada para aquele instante e não queria estar ali, não queria mais existir, ser, continuar.
Algumas pessoas perdem as forças e desmaiam. Ela também queria perdê-las, mas o grito na garganta era tão grande que ela explodiria se não fizesse algo mais, se não cansasse o corpo até não mais sentir.
Ajoelhada no meio da sala de estar, o telefone derramado entre as coxas, os olhos desertos, areia abandonada pelo mar, ombros duros feito rocha depois de longos minutos de choro convulso.
Solidão, a indescritível solidão de perceber-se sem laços com mais ninguém. O pai era o último porto, o resto da família já não mais existia, ela era a última pegada daquela história neste mundo.
Catou a bolsa, calçou o tênis e antes de procedimentos e dolorosas burocracias, correu pela areia, sem rumo, sem sentido, sal no rosto, na pele, na respiração entrecortada pelos soluços.
Chegou cambaleando para resolver sozinha todas as coisas. Olhou o rosto inerte, massacrado pelos longos dias de internação e se deu conta de que a dor dele cessara. Ele já não estava lá bem antes.
Suspirou: um misto de alívio, tristeza, saudade e resignação. Quantas linhas lhe restariam? Quem poderia dizer? Os espaços em branco ainda precisavam ser preenchidos. Quisera arrancar aquela página, reviver capítulos anteriores. Não havia esta opção. Certos livros são tão intensos, tão únicos, tão nossos que nos é impossível reler. As linhas ficam entranhadas no rosto, nas mãos, nos caminhos. Caminhos que precisam continuar a ser trilhados...
* A imagem foi retirada do site https://freerangestock.com/. e representa a imensa solidão que sentimos quando perdemos nossos pais ou nossas referências. A sensação de desamparo de quando éramos crianças e nos víamos sós. O "Adagio de Albinoni" é uma das canções que mais me deixam triste. A ideia era passar o mesmo sentimento ao leitor.